O crescimento do número de carros com os adesivos “Família feliz” me fez pensar em duas coisas, uma agradável, a outra nem tanto.

A primeira é o começo do livro “Ana Karenina”, de Tolstoi, sobre as famílias felizes serem parecidas; hoje elas colocam em seus carros desenhos do casal, dos filhos e dos animais de estimação. Já o dissabor veio do que narro a seguir.
Segundo amplamente noticiado pela imprensa, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o direito à pensão na união homoafetiva, e abriu caminho para a sua equiparação ao casamento e inclusão entre as formas de família. A decisão foi divulgada com destaque pela mídia, especialmente quanto ao argumento do relator: ninguém perde com a equiparação e a minoria homossexual ainda ganha.
Ao invés de abordar o assunto do ponto de vista formal – se competia ao STF ou ao Congresso Nacional, pois a resposta é evidente –, prefiro tratar da questão de fundo (a tal oferta do bruxo), do silêncio dos oprimidos e da frase do ministro relator.
Começo pelo ministro. À primeira vista, o que disse soa bem e parece razoável, pois a balança da justiça permanece inalterada para a maioria “não interessada”, enquanto a minoria envolvida sai no lucro. No entanto, por ser um fundamento consequencialista, vai contra o conceito de justiça, que é dar a cada um o que é seu segundo a natureza das coisas.
O consequencialismo é pautar-se principalmente pelos resultados. Assim, o critério de levar ganhos a uns e não prejuízos aos outros, independentemente da sua natureza e dos seus direitos, acaba sendo injusto. Sirvo-me de uma analogia para explicar o erro e até o absurdo dessa postura. Vamos supor que apareça no Brasil uma minoria denominada “zooafetiva”, a favor da união legal entre um homem ou uma mulher com um animal. Depois de bem orquestrada campanha, tal minoria recorre ao Supremo para a equiparação dessa união ao casamento e à família. O mesmo ministro e seus pares acatarão o pedido, afinal ninguém perde e os “zooafetivos” ganham.

Passo à questão de fundo, que é a natureza mesma do casamento e da família. No livro “A Abolição do Homem”, Lewis explica a “oferta do bruxo”: o homem cede objeto atrás de objeto, e finalmente cede a si próprio e à Natureza, sempre em troca de poder. No presente caso, está cedendo uma coisa básica, que é a distinção natural entre homem e mulher, base do matrimônio. Em troca de quê, não se sabe.
Os dois pilares do casamento e da família – a distinção homem-mulher e o amor entre ambos, gerador de novas vidas – reduzem-se a pó com a equiparação à união homoafetiva. Nesta estão ausentes os elementos biológicos e antropológicos do matrimônio e da família, pois não há condições de garantir de modo adequado a sobrevivência da nossa espécie. A eventual utilização dos meios de fecundação artificial, além de comportar desrespeito à dignidade humana, não alteraria a sua inadequação.
Finalmente, o que mais chama a atenção é o silêncio ensurdecedor dos que veem que há algo de falso e estranho na decisão do STF. Por que se calam? A meu ver, porque a questão homossexual foi colocada de tal maneira que ou se é a favor, ou se é contra. Ser a favor pega bem. Ser contra, pelo contrário, significa cometer o que em breve será um crime grave. Não há matiz, graduação nem perspectiva.
Defender uma opinião diferente torna-se complicado para o cidadão comum, normal, que já começa a ter vergonha de estar casado com uma mulher e ter filhos. Perplexo ante o tsunami da causa gay, prefere calar a receber o estigma de fundamentalista intolerante e entrar no rol dos futuros réus.
Pois é a você, cidadão comum e normal, que me dirijo. Não se trata de sair combatendo nada nem ninguém, mas apenas de defender serenamente uma posição que, francamente, tem todo o peso da Natureza, da verdade e do bom senso. Nada contra o reconhecimento dos direitos das pessoas do mesmo sexo, nos termos de uma associação. Mas daí a chamar de casamento e família é outra história