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quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Alegria do Amor” – parte 4- A REALIDADE E OS DESAFIOS DAS FAMÍLIAS

Nosso Papa Francisco escreveu uma bela carta apostólica, em abril deste ano. Vou transcrever aqui aos poucos, algumas partes, para que reflitamos sobre os pontos que mais tocam as famílias.

A REALIDADE E OS DESAFIOS DAS FAMÍLIAS

O bem da família é decisivo para o futuro do mundo e da Igreja. Inúmeras são as análises feitas sobre o matrimônio e a família, sobre as suas dificuldades e desafios atuais. É salutar prestar atenção à realidade concreta, porque «os pedidos e os apelos do Espírito ressoam também nos acontecimentos da história» através dos quais «a Igreja pode ser guiada para uma compreensão mais profunda do inexaurível mistério do matrimônio e da família». 

A situação atual da família

«Fiéis ao ensinamento de Cristo, olhamos a realidade atual da família em toda a sua complexidade, nas suas luzes e sombras. Hoje, a mudança antropológico-cultural influencia todos os aspectos da vida e requer uma abordagem analítica e diversificada». Já no contexto de várias décadas atrás, os bispos da Espanha reconheciam uma realidade doméstica com mais espaços de liberdade, «com uma distribuição equitativa de encargos, responsabilidades e tarefas (...). Valorizando mais a comunicação pessoal entre os esposos, contribui-se para humanizar toda a vida familiar. Nem a sociedade em que vivemos nem aquela para onde caminhamos permitem a sobrevivência indiscriminada de formas e modelos do passado». Mas «estamos conscientes da direção que vão tomando as mudanças antropológico-culturais, em razão das quais os indivíduos são menos apoiados do que no passado pelas estruturas sociais na sua vida afetiva e familiar».

Por outro lado, «há que considerar o crescente perigo representado por um individualismo exagerado que desvirtua os laços familiares e acaba por considerar cada componente da família como uma ilha, fazendo prevalecer, em certos casos, a ideia dum sujeito que se constrói segundo os seus próprios desejos assumidos com caráter absoluto. «As tensões causadas por uma cultura individualista exagerada da posse e fruição geram no seio das famílias dinâmicas de impaciência e agressividade». Gostaria de acrescentar o ritmo da vida atual, o stress, a organização social e laboral, porque são fatores culturais que colocam em risco a possibilidade de opções permanentes. Ao mesmo tempo, encontramo-nos perante fenômenos ambíguos. Por exemplo, aprecia-se uma personalização que aposte na autenticidade em vez de reproduzir comportamentos prefixados. É um valor que pode promover as diferentes capacidades e a espontaneidade, mas, se for mal orientado, pode criar atitudes de permanente suspeita, fuga dos compromissos, confinamento no conforto, arrogância. A liberdade de escolher permite projetar a própria vida e cultivar o melhor de si mesmo, mas, se não se tiver objetivos nobres e disciplina pessoal, degenera numa incapacidade de se dar generosamente. De fato, em muitos países onde diminui o número de matrimônios, cresce o número de pessoas que decidem viver sozinhas ou que convivem sem coabitar. Podemos assinalar também um louvável sentido de justiça; mas, mal compreendido, transforma os cidadãos em clientes que só exigem o cumprimento de serviços.

Se estes riscos se transpõem para o modo de compreender a família, esta pode transformar-se num lugar de passagem, aonde uma pessoa vai quando lhe parecer conveniente para si mesma ou para reclamar direitos, enquanto os vínculos são deixados à precariedade volúvel dos desejos e das circunstâncias. No fundo, hoje é fácil confundir a liberdade genuína com a ideia de que cada um julga como lhe parece, como se, para além dos indivíduos, não houvesse verdades, valores, princípios que nos guiam, como se tudo fosse igual e tudo se devesse permitir. Neste contexto, o ideal matrimonial com um compromisso de exclusividade e estabilidade acaba por ser destruído pelas conveniências contingentes ou pelos caprichos da sensibilidade. Teme-se a solidão, deseja-se um espaço de proteção e fidelidade, mas, ao mesmo tempo, cresce o medo de ficar encurralado numa relação que possa adiar a satisfação das aspirações pessoais.

Como cristãos, não podemos renunciar a propor o matrimônio, para não contradizer a sensibilidade atual, para estar na moda, ou por sentimentos de inferioridade face ao descalabro moral e humano; estaríamos a privar o mundo dos valores que podemos e devemos oferecer. É verdade que não tem sentido limitar-nos a uma denúncia retórica dos males atuais, como se isso pudesse mudar qualquer coisa. De nada serve também querer impor normas pela força da autoridade. É-nos pedido um esforço mais responsável e generoso, que consiste em apresentar as razões e os motivos para se optar pelo matrimônio e a família, de modo que as pessoas estejam mais bem preparadas para responder à graça que Deus lhes oferece.

 Ao mesmo tempo devemos ser humildes e realistas, para reconhecer que às vezes a nossa maneira de apresentar as convicções cristãs e a forma como tratamos as pessoas ajudaram a provocar aquilo de que hoje nos lamentamos, pelo que nos convém uma salutar reação de autocrítica. Além disso, muitas vezes apresentámos de tal maneira o matrimônio que o seu fim unitivo, o convite a crescer no amor e o ideal de ajuda mútua ficaram ofuscados por uma ênfase quase exclusiva no dever da procriação. Também não fizemos um bom acompanhamento dos jovens casais nos seus primeiros anos, com propostas adaptadas aos seus horários, às suas linguagens, às suas preocupações mais concretas. Outras vezes, apresentámos um ideal teológico do matrimônio demasiado abstrato, construído quase artificialmente, distante da situação concreta e das possibilidades efetivas das famílias tais como são. Esta excessiva idealização, sobretudo quando não despertámos a confiança na graça, não fez com que o matrimônio fosse mais desejável e atraente; muito pelo contrário.

sábado, 6 de agosto de 2016

Alegria do Amor – parte 3 - A ternura do abraço

Nosso Papa Francisco escreveu uma bela carta apostólica, em abril deste ano. Vou transcrever aqui aos poucos, algumas partes, para que reflitamos sobre os pontos que mais tocam as famílias.
A ternura do abraço

A ternura do abraço


Como distintivo dos seus discípulos, Cristo pôs, sobretudo a lei do amor e do dom de si mesmo aos outros (cf. Mt 22, 39; Jo 13, 34), e fê-lo através dum princípio que um pai ou uma mãe costumam testemunhar na sua própria vida: «Ninguém tem maior amor do que quem dá a vida pelos seus amigos» (Jo 15, 13). Frutos do amor são também a misericórdia e o perdão. Nesta linha, é emblemática a cena que nos apresenta uma adúltera na explanada do templo de Jerusalém, primeiro, rodeada pelos seus acusadores e, depois, sozinha com Jesus, que não a condena mas convida-a a uma vida mais digna (cf. Jo 8, 1-11).

No horizonte do amor, essencial na experiência cristã do matrimônio e da família, destaca-se ainda outra virtude, um pouco ignorada nestes tempos de relações frenéticas e superficiais: a ternura. Detenhamo-nos no terno e denso Salmo 131, onde – como se observa, aliás, noutros textos (cf. Ex 4, 22; Is 49, 15; Sl 27/26, 10) – a união entre o fiel e o seu Senhor é expressa com traços de amor paterno e materno. Lá aparece a intimidade delicada e carinhosa entre a mãe e o seu bebé, um recém-nascido que dorme nos braços de sua mãe depois de ter sido amamentado. Como indica a palavra hebraica gamùl, trata-se dum menino que acaba de mamar e se agarra conscientemente à mãe que o leva ao colo. É, pois, uma intimidade consciente, e não meramente biológica. Por isso canta o Salmista: «Estou sossegado e tranquilo, como criança saciada ao colo da mãe» (Sl 131/130, 2). Paralelamente, podemos ver outra cena na qual o profeta Oseias coloca na boca de Deus, visto como pai, estas palavras comoventes: «Quando Israel era ainda menino, Eu amei-o (...), Eu ensinava Efraim a andar, trazia-o nos meus braços (...). Segurava-o com laços de ternura, com laços de amor, fui para ele como os que levantam uma criancinha contra o seu rosto; inclinei-me para ele para lhe dar de comer» (Os 11, 1.3-4).

Com este olhar feito de fé e amor, de graça e compromisso, de família humana e Trindade divina, contemplamos a família que a Palavra de Deus confia nas mãos do marido, da esposa e dos filhos, para que formem uma comunhão de pessoas que seja imagem da união entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Por sua vez, a atividade geradora e educativa é um reflexo da obra criadora do Pai. A família é chamada a compartilhara oração diária, a leitura da Palavra de Deus e a comunhão eucarística, para fazer crescer o amor e tornar-se cada vez mais um templo onde habita o Espírito.

Cada família tem diante de si o ícone da família de Nazaré, com o seu dia-a-dia feito de fadigas e até de pesadelos, como quando teve que sofrer a violência incompreensível de Herodes, experiência que ainda hoje se repete tragicamente em muitas famílias de refugiados descartados e inermes. Como os Magos, as famílias são convidadas a contemplar o Menino com sua Mãe, a prostrar-se e adorá-Lo (cf. Mt 2, 11). Como Maria, são exortadas a viver, com coragem e serenidade, os desafios familiares tristes e entusiasmantes, e a guardar e meditar no coração as maravilhas de Deus (cf. Lc 2, 19.51). No tesouro do coração de Maria, estão também todos os acontecimentos de cada uma das nossas famílias, que Ela guarda solìcitamente. Por isso pode ajudar-nos a interpretá-los de modo a reconhecera mensagem de Deus na história familiar.

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Mudança alimentar - partilha de uma mãe

Por Raquel Suppi
 
Há pouco mais de um ano, minha família vem passando por uma importante mudança alimentar. Embora não tivéssemos exatamente um “plano”, receita ou cardápio elaborado, tínhamos consciência de que precisávamos mudar e, mais que isso, uma grande motivação.

Despertamos para isso quando o nosso filho do meio, na época com 2 anos, começou a passar mal, com certa constância. Volta e meia aparecia com dores, enjoos e crises frequentes de vômitos e diarreia. Foi quando nos demos conta do quanto estávamos falhando não apenas com a alimentação dele, mas de toda a família. Percebemos que, especialmente ele, pouco a pouco foi mudando seus hábitos e gostos alimentares, substituindo alimentos naturais e saudáveis pelos industrializados e cheios de conservantes. Sem que nos déssemos conta, nossa geladeira e despensa passaram a ser abastecidas principalmente por comidas com baixo valor nutricional. Era tão mais “prático” e tão mais fácil de “conquistar” o paladar da criançada, que muitas vezes pensava: “pelo menos estão comendo alguma coisa”. No entanto, isso começou a nos incomodar. Precisávamos mudar, só não sabíamos como, e tínhamos certeza de que não seria fácil.

Comecei lendo livros, conversando com algumas pessoas (entre elas, o pediatra das crianças) e pesquisando muito sobre como adquirir novos hábitos alimentares e reintroduzir alimentos saudáveis na família. Assim, bem devagar, demos os primeiros passos. Mais de um ano depois, eu me alegro em poder constatar que, entre altos e baixos, acertos e deslizes, fizemos progressos significativos.
Antes de prosseguir, gostaria de deixar claro que minha intenção é apenas a de partilhar um pouco sobre a nossa experiência particular, como família. Não pretendo, de modo algum, impor um estilo de vida ou passar a imagem de “expert” no assunto (aconselho, inclusive, a consultarem um médico ou nutricionista). Sei muito bem que cada família tem um meio próprio de lidar com as coisas, seja de qual for a natureza. Portanto, além da minha, não estou apta e nem tenho a pretensão de dar diretrizes e palpites para nenhuma outra. Penso apenas que, talvez (quem sabe?), este simples relato possa ajudar alguém, de alguma forma, assim como tantos outros nos serviram de inspiração.

Nosso maior medo, virou a nossa grande motivação: evitar que nossos filhos crescessem com um péssimo hábito alimentar. O objetivo era (e continua sendo) que toda a família voltasse a consumir uma grande variedade de frutas, verduras, sucos naturais e todo tipo de comida saudável. Como pais, sentimo-nos responsáveis de apontar o caminho certo e sermos o modelo, em todas as áreas, inclusive na da alimentação. Portanto, toda a família seria alcançada e beneficiada com a mudança. 

Mesmo envolvendo todo mundo, o nosso principal alvo, a princípio, era o nosso filho do meio. Não apenas pela suspeita de alergia alimentar e frequentes reclamações de dores e mal-estar, mas também porque era ele quem mais precisava de uma boa reeducação alimentar. Dos três, era quem menos comia frutas (praticamente nenhuma) e comida natural. Se permitíssemos, só se alimentava de chocolate, biscoitos e doces. Somando tudo isso a uma forte personalidade, sabíamos que ele seria o nosso grande desafio. Mas, uma coisa era certa, se conseguíssemos reconquistar o seu paladar, com os demais seria menos complicado.

Inicialmente, ficamos entre dois caminhos: cortar logo tudo e radicalizar, ou mudar com moderação. Não demorou muito para perceber que, com a gente, a segunda opção seria mais viável, ainda que demorasse mais para vermos os resultados.

Começar foi o mais complicado. Ainda tínhamos muitos alimentos que gostaríamos de cortar, em casa. Mas, de certa forma, eles acabaram nos ajudando: serviram de negociação. Na hora do lanche, por exemplo, quando eu oferecia fruta ou outra coisa saudável e nutritiva, e as crianças rejeitavam, pedindo algo que não deveriam comer, eu fazia a seguinte proposta: se comer primeiro isto, depois a mamãe dá um pouco do que você quer. E funcionou! Às vezes, davam apenas uma mordidinha de nada, mas pelo menos provavam, coisa que não acontecia antes.

Aos poucos, as mordidas foram aumentando e a “recompensa” diminuindo. Devagar, nossa despensa e geladeira passaram a estocar alimentos muito mais saudáveis. E, naturalmente, os filhos foram esquecendo e deixando de pedir para comer o que antes parecia ser indispensável! Assim, sem tanta radicalidade e sofrimento, estamos conseguindo adquirir novos hábitos, muito mais saudáveis!

Estamos longe de ser exemplo de alimentação. Ainda temos muito o que aprender e inserir no nosso dia a dia. Mas estamos muito felizes com os progressos realizados! Tem sido desafiante, mas muito gratificante! Ouvir o filho do meio, por exemplo, que até pouco tempo dava tudo por um alimento processado, pedir uma maçã de lanche, sem que eu precise fazer nenhum tipo de “combinado”, não tem preço!