Um herói sem medalhas
Obs.: Este episódio se deu ao final da Segunda Guerra, na Alemanha, quando éramos conduzidos para um albergue numa aldeia chamada Heinesreuth, próximo a Bayreuth, cidade de Richard Wagner, o compositor.
Éramos um grupo bem grande de pessoas de todas as idades, na maioria idosos, mulheres e crianças.
Atravessávamos um bosque como aqueles dos contos de fadas dos Irmãos Grimm. Árvores altas, eretas, de tronco liso e copa pequena deixando entrar a luz do sol. Baixos arbustos de frutas silvestres aqui e ali. Singelas flores do campo por toda a parte. Borbulhar das águas de fontes e regatos correndo ligeiras por cima de pedras e cascalhos. Assim era nossa floresta, mas naquela tarde não prestamos muita atenção a ela, e os pássaros, lebres e corças, assustados com nosso barulho, devem ter se refugiado mais além.
Soldados conduziam o grupo com suas baionetas às costas. Davam ordens e instruções numa língua estranha para nós. Algumas vezes faziam-nos abaixar e rastejar como cães de caça. Sentíamos, então, de perto, o cheiro da umidade da terra , do musgo e das folhas e agulhas de pinheiros que atapetavam o chão. Tudo isso se misturava com certo medo, pois não compreendíamos bem o que se passava.
Mamãe estava atrapalhada. Ela não podia perder-nos. Éramos três meninas pequenas e ela não podia segurar-nos a todas como desejaria. Minha irmã mais nova ainda nem andava. Além disso , mamãe levava uma valise com documentos, retratos de família e não sei bem mais o quê. Sem que o esperasse, um dos soldados tirou a valise de suas mãos e carregou-a por alguns metros. Desculpando-se, sorriu para ela com doçura. Era muito jovem, quase um adolescente. Procurando com muita dificuldade as palavras, conseguiu, enfim, dizer: “Sinto muito, mas somos proibidos de ajudar os refugiados” e acrescentou bem devagar: “Meus avós, na América, ensinaram-me um pouco de sua língua. Eles também eram húngaros.” Olhou-nos com o coração e depois retomou seu posto.
Mamãe contava esse pequeno episódio com a voz embargada de gratidão.
Agnes G. Milley
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