Por Rafael Carneiro Rocha
Meditemos sobre a bela passagem do Evangelho de São Lucas:
Estando Jesus em viagem, entrou numa aldeia, onde uma mulher, chamada Marta, o recebeu em sua casa. Tinha ela uma irmã por nome Maria, que se assentou aos pés do Senhor para ouvi-lo falar. Marta, toda preocupada na lida da casa, veio a Jesus e disse: Senhor, não te importas que minha irmã me deixe só a servir? Dize-lhe que me ajude. Respondeu-lhe o Senhor: Marta, Marta, andas muito inquieta e te preocupas com muitas coisas; no entanto, uma só coisa é necessária; Maria escolheu a boa parte, que lhe não será tirada (Lc, 10; 38-42).
Serve para todas as épocas.
Apesar da agitação da vida contemporânea, sofremos da armadilha que o escritor G.K. Chesterton bem notou na sua piada sobre os carros que ele via aparecer no mundo moderno. Como alguém é capaz de dizer que vivemos numa sociedade dinâmica e movimentada se o que fazemos nesses veículos é ficar, simplesmente, parados?
O agravante curioso da nossa correria é que, muitas vezes, a falta generalizada de tempo é provocada por esperas em aeroportos atrasados, escritórios muito procurados e trânsitos congestionados.
Apesar de muito ocupados, ficamos bastante tempo parados. Na agitação paradoxal das pausas, é inevitável que pensemos muito em nós mesmos. Ensimesmados com projetos e conflitos, perturbamos demasiadamente o nosso eu. Assim, criamos tantos problemas pessoais que o mero fato de alguém dizer que está com “problemas pessoais” se torna uma auto-afirmação legítima da seriedade com o que o indivíduo encara o seu eu.
A criação de nossos papéis na sociedade demanda a construção trabalhosa do “eu”. Mas é interessante observar que algumas vidas repletas de paixão e de sentido careceram - e muito - de projetos para o “eu”. A humanidade perderia muito se um São Francisco de Assis estivesse angustiado com projetos pessoais.
Claro que pouquíssimos são “chamados” para o esquecimento radical de si, numa vida devotada ao altruísmo. Porém, ainda que não sintamos esse convite, é interessante que sempre tenhamos tempo para esquecer um pouco das repetições cotidianas e saborear alteridades. Valem a pena uma oração mental no congestionamento, uma leitura na fila do banco e até mesmo boas conversas com familiares, para fugirmos de rotinas sufocantes que nos passam despercebidas, como o compromisso diário com a telenovela e com as redes sociais da internet.
terça-feira, 9 de novembro de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário