Texto de: Rafael Carneiro Rocha
Eu não me esqueço do final do filme de Roberto Rossellini sobre São Francisco de Assis (Francisco, arauto de Deus; 1950). São Francisco forma pequenos grupos entre os seus queridos e pede que eles se espalhem pelo mundo. A câmera de Rossellini fixa o conjunto de atores e não há cenas que dramatizem em excesso a despedida dos amigos. O cineasta constroi uma cena bela, mas de uma crueza medieval que impressiona a nossa sensibilidade moderna.
Para nós, os modernos, nos provoca alguma sensação de luto encerrar uma época escolar de boas lembranças, terminar um namoro que parece ter tido algum sentido, finalizar um trabalho que nos cativou ou qualquer outra despedida agradável de rotina. Uma melancolia que parece ser agravada por uma cultura como a nossa, que conhece o significado da palavra saudade.
Aliás, os agravantes para o nosso luto são vários. É bom lembrar que numa cultura muito secularizada, as perspectivas espirituais se esvaem e tudo o que o mundo deixa ir embora parece se desvanecer nessa mesma proporção.
Mas até mesmo essa amargura moderna tem o seu valor, porque ela surge como o irônico lembrete de que o ser humano não é inclinado ou vocacionado para a morte.
As perdas convidam o indivíduo para algo muito maior do que o amadurecimento pessoal, esta fragilidade que o nosso conformismo simplório tenta se apegar.
O caminho da existência não se perde; pelo contrário, tudo nos leva a encontros incessantes e a destinos ressurrectos. Tudo se encerra numa poética grandiosa do real, como aquelas imagens do filme de Rossellini.
terça-feira, 30 de março de 2010
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Um comentário:
Muito bonita a reflexão.
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