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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

O capitão e o passageiro

Por Rafael Carneiro Rocha

Nisto surgiu uma grande tormenta e lançava as ondas dentro da barca, de modo que ela já se enchia de água. Jesus achava-se na popa, dormindo sobre um travesseiro. Eles acordaram-no e disseram-lhe: Mestre, não te importa que pereçamos? E ele, despertando, repreendeu o vento e disse ao mar: Silêncio! Cala-te! E cessou o vento e seguiu-se grande bonança. (Mc 4; 37,39)

Esta passagem do Evangelho de São Marcos me fez pensar nas tragédias climáticas que vitimam centenas de brasileiros todos os anos. No janeiro que terminou, o Rio daquele mês parece ter sido ignorado por um Deus que dormia. Sobre os mortos não encontrados, mesmo os mais crédulos não teriam gritado se Deus não seria mais um escondido? O grito dos agonizantes remete ao sofrimento de Jesus Cristo: "Pai, por que me abandonastes?"

Mas talvez o que os sofredores não sabem é que mesmo esse princípio de revolta contra o Deus que consentiu a tragédia, é uma das mais pungentes orações. É absurdo demais que Deus seja indiferente às tempestades. Ainda que aparentemente Ele durma, ele está na popa.

Nas embarcações, a popa é a área que permite visibilidade privilegiada e onde se localiza o leme do navio. Tradicionalmente, a popa é o local do navio onde também se encontra o aposento do capitão. O navio prevê o repouso do seu chefe, mas mesmo quando ele dorme, ou quando há uma tormenta, sua posição é privilegiada. Ele está no lugar certo, de quem manobra a pujança das águas.

O mar existe em beleza e violência. As ondas que invadem as barcas são manifestações do que é fugaz. Por isso, o passageiro só sairá vivo se permitir a chegada da beleza. Quando se cessarem todos os ventos, seguirá a bonança permanente.

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