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quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Quarenta tons de Cinzas

 

Todo ano, na quarta-feira após o Carnaval, os Católicos vivem a chamada “Quarta-feira de Cinzas”, na qual, se maiores de idade e sem impedimento médico, fazem jejum e abstinência de carne. Diversas vezes já tive que explicar aos amigos e parentes, estando em casa de praia (tínhamos ido para o Carnaval e íamos estender o feriado até domingo), o porque dessa prática.

A quarta-feira de Cinzas marca o início da Quaresma – 40 dias - tempo litúrgico de reflexão, penitência e conversão para os católicos, em que nos lembramos da nossa condição de mortais (“lembra-te que és pó…e ao pó voltarás”) e nos voltamos para as coisas espirituais, reforçando a ascese, a disciplina, nos abstendo de prazeres supérfluos e podando nossos defeitos, tentando viver as virtudes…

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Porque é que o barro e a cinza se orgulham, pergunta o Sábio (Eccli 10, 8). Todos os homens, diz ainda, são apenas terra e cinza (17, 31). Os povos, depois de um rápido brilho, são como um amontoado de cinza depois do incêndio, diz Isaías (33, 12).

A nossa vida desaparecerá como se extingue uma faúlha, diz o Sábio, e o nosso corpo cairá feito em cinzas (Sab 2, 3).

Abraão dizia: «Ousarei falar a Deus, eu que não sou senão cinza e pó?» (Gen 18, 27).

Já no Antigo Testamento os homens cobriam se de cinzas para exprimir sua dor e humilhação, como se pode ler no livro de Jó. Nos primeiros séculos da Igreja os penitentes públicos apresentavam-se nesse dia ao bispo ou penitenciário: pediam perdão revestidos de um saco, e como sinal de sua contrição cobriam a cabeça de cinzas. Mas como todos os homens são pecadores, diz santo Agostinho, essa cerimônia estendeu-se a todos os fiéis, para lhes recordar o preceito da penitência. Não havia exceção alguma: pontífices, bispos, sacerdotes, reis, almas inocentes, todos se submetiam a essa humilhante expressão de arrependimento. (Adaptado de Quarta-Feira de Cinzas, em Meditações para todos os dias do ano. Pe. Luís Bronchain CSSR, Petrópolis, Editora Vozes, 1949 - 2ª edição em português, pag. 132-134)

Nesse período de renovação interior, o cristão dispõe de instrumentos úteis para combater o mal, as paixões negativas e os vícios (cf. Mt 6, 1-6.16-18): as obras de caridade (a esmola), a oração e a penitência (o jejum) – três práticas fundamentais valorizadas também pela tradição hebraica, porque contribuem para purificar o homem aos olhos de Deus.

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A cerimônia das cinzas, através do sinal material das cinzas na fronte, me recorda a minha mortalidade, minha fragilidade.

Na quaresma, buscamos intensificar as práticas piedosas (como a Via Sacra, por exemplo), e as obras de caridade. É “turbinar” a vida espiritual para um novo recomeço, com a Páscoa. Deus é bom e nos dá uma nova oportunidade de conversão. Busquemo-Lo enquanto Ele se deixa encontrar (Is 55, 6-7).

A mortificação, busca deliberada do sacrifício e da privação, é um meio e não um fim em si mesma. O que visamos é o fruto espiritual e de conversão que ela traz. Jesus jejuou por quarenta dias no deserto, antes de enfrentar o demônio, e nos ensinou a usar a mortificação como grande arma para combater o mal. Infelizmente, nossa sociedade, que aceita bem o masoquismo (veja-se a grande popularidade do livro e filme “Cinquenta Tons de Cinza”), se escandaliza com a mortificação. Difícil de entender!  Experimente dizer que vai jejuar na quarta-feira de cinzas, ou que vai se desligar das redes sociais por quarenta dias, ou qualquer outra penitência… nossa, acham um absurdo… !! Mas ser cristão é isso, nadar contra a corrente, buscando agradar a Deus e não aos homens.

Importante lembrar, contudo, que a quaresma não é tempo de tristeza, pois, livre de seus males e paixões desordenadas, a alma fica mais leve e feliz. E também, é Jesus mesmo quem diz:

“Quando jejuardes, não tomeis um ar triste como os hipócritas, que mostram um semblante abatido para manifestar aos homens que jejuam. Em verdade eu vos digo: já receberam sua recompensa. Quando jejuares, perfuma a tua cabeça e lava o teu rosto. Assim, não parecerá aos homens que jejuas, mas somente a teu Pai que está presente ao oculto; e teu Pai, que vê num lugar oculto, recompensar-te-á.” (Mt 6, 16-18)

Uma boa e frutuosa quaresma para nós, para que, mortificando o espírito, ressuscitemos novas criaturas na Páscoa!

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